quinta-feira, 11 de março de 2010

Nível de mercúrio em cabelo pode estar ligado à alimentação

Mercúrio em cabelos de crianças pode
estar relacionado ao consumo de peixes
O teor de mercúrio (Hg) presente em cabelos de crianças das cidades de Cubatão e Cananéia, no estado de São Paulo, foi analisado e comparado em pesquisa que vem sendo desenvolvida pelo Instituto de Oceanografia (IO) da USP, em parceria com o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). 

Foi verificado que a média de mercúrio presente em fios de cabelo de crianças de Cananéia é maior se comparada à cidade de Cubatão.

Segundo  Luciana Farias, pós-doutoranda do IO e uma das responsáveis pelo desenvolvimento da pesquisa, "a hipótese inicial do estudo era de que, pelo fato de a cidade de Cubatão ser conhecida como uma das mais poluídas do País, o teor de mercúrio seria maior do que em Cananéia. Ao finalizar o estudo, observamos que isso não procede."

Para chegar às conclusões da pesquisa, foram analisados fios de cabelos de 200 crianças das duas cidades. "Escolhemos direcionar nossa pesquisa às crianças porque elas são mais sensíveis aos efeitos do mercúrio do que os adultos e, além disso, o fio de cabelo indica a exposição ao elemento ao longo de um período, ou seja, conta a história da exposição de uma pessoa", explica a pesquisadora.

O valor limite de mércurio em cabelo para uma população adulta não exposta recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de 2 mg kg-1 (2 miligramas para cada quilo de cabelo), os valores medianos obtidos em Cananéia e Cubatão foram 0,36 mg kg-1 e 0,27 mg kg-1, respectivamente. Ainda não existem valores de referências estabelecidos para crianças.

"A média observada em Cananéia não foi superior à estabelecida pela OMS e a região não apresenta impactação pelo mercúrio tal qual acontece na Amazônia. Contudo, o interessante desses dados é que, ao contrário do que se esperava, os valores médios nos cabelos das crianças de Cananéia foram mais altos do que nas crianças de Cubatão, evidenciando a influência da prática alimentar. Podemos, a partir disso, fazer um mapeamento do litoral sul paulista e identificar quais fatores ajudam a aumentar esses níveis do elemento em crianças da região", descreve Luciana.

Hábitos Alimentares
Estes resultados evidenciam que a população de Cubatão quase não consome peixe. Informação confirmada pelos questionários de inquérito alimentar respondido pelos participantes do estudo, aliado ao fato de que os peixes provavelmente são provenientes de outras regiões do País, como o litoral catarinense. Por outro lado, a população de Cananéia ainda utiliza o peixe como uma importante fonte protéica.


Em entrevistas realizadas com os pais das crianças participantes do estudo também foi perguntado sobre as espécies de peixes mais consumidas, com o objetivo de avaliar a qualidade do pescado consumido pela população local. As espécies mais citadas, foram Corvina, Pescada, Tainha e Robalo Flexa em Cananéia, e Sardinha, Pescada Foguete, Tainha, Perna de Moça e Corvina em Cubatão.

Nenhuma das espécies estudadas ultrapassou o valor recomendado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), para o limite máximo de tolerância para o mercúrio total em peixes, que é de 1 mg kg-1 para espécies predadoras e 0,5 mg kg-1 para espécies não predadoras e produtos da pesca. É sabido que as espécies que costumam apresentar maiores concentrações de mercúrio são as espécies predadoras. Já a Tainha, por exemplo, com hábito alimentar planctívoro (que se alimenta de plancton e algas) apresentou os teores mais baixos no músculo", diz.

O mercúrio não está presente apenas em peixes, mas pode ser encontrado também em outros animais, bem como em plantas. Além das fontes antrópicas, também é um elemento que ocorre naturalmente no meio ambiente e que se biomagnifica — aumenta sua concentração a cada nível da cadeia alimentar —, por isso os peixes predadores são os que apresentam maiores concentrações do elemento.

A partir dos dados obtidos nesta pesquisa, Luciana pretende ampliar o estudo e analisar o teor de mercúrio nos fios de cabelos de crianças de Iguape e peixes da região, também no litoral sul de São Paulo. "Talvez possamos encontrar algum resultado diferente. Mas, o mais importante do que isso é o trabalho de mapeamento do litoral paulista e a continuação das pesquisas nessa área, que com exceção da Amazônia, é pouco realizada no resto do País", conclui a pesquisadora.

A pesquisa conta com a coordenação da professora Elisabete S. Braga, do Laboratório de Nutrientes, Micronutrientes e Traços do Mar (LABNUT) do IO, e de Débora Ines Favaro, do Ipen.

Ana Carolina Athanásio | Agência USP

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